domingo, 9 de outubro de 2011

Só no final de semana

Chuva lá fora numa segunda-feira. Passo na padaria na volta do trabalho antes de ir para casa e parece que todo mundo teve a mesma ideia: comprar pão, queijo e presunto para fazer um lanche à noite. Na hora de pagar, a fila não andava. Na minha frente umas oito pessoas sendo atendidas com o compasso de Brasília, sem pressa nenhuma.

Cada passo rumo ao caixa era uma vitória, mas não rendia, parecia uma eternidade. A sensação era de que nunca mais sairia dali. Depois de checar emails no celular e sem ter mais o que fazer, começo a observar ao meu redor. A moça que tinha acabado de sair da academia ainda mostrava as marcas de suor na roupa; mãe e filha também passavam a lista de compras verbalmente para ver se não haviam esquecido nada; outra senhorinha, sozinha, equilibrava tantos produtos nas mãos que parecia ter feito a compra do mês ali mesmo (essa ia demorar mesmo)...


Imediatamente à minha frente, um “enternado” de uns 40 anos levemente careca já com o nó da gravata meio desfeito, estilo fim do dia. Num primeiro momento, achei que estivesse sozinho. De repente, veio uma garotinha de uns dois ou três anos, com cabelinhos cacheados, nem loiros, nem castanhos, olhos amendoados em sua direção. Ela estava com a mão cheia de balinhas que pegou no balcão, estrategicamente rebaixado com as guloseimas coloridas para atiçar as criaturinhas.

“Papai, adoro essas balinhas.”


“É mesmo filha? São de morango.”


“São. Mas só no final de semana, né?


“Isso. Só no final de semana.”

Ela volta ao balcão, devolve as delícias e observa mais as novidades – eu a observo. Espia, espia e pega um tic-tac de caixinha azul. Volta na direção do adulto toda excitada.


“Papai! Papai!”


“Oi, querida.”


“Você gosta de tic-tac?” - e esconde a caixinha atrás do corpo.


“Gosto muito.”


Ela mostra os rebuçados e diz: “eu também”.


“Mas este é da caixinha azul.”


“É bom, não é papai?”


“Eu acho muito ardido, prefiro os outros.”


“Eu não, eu gosto destes. Mas só no final de semana, né?”


“Isso. Só no final de semana.”


A menina volta ao caixa, que agora está um pouco mais perto, pois já demos uns dois ou três passos. Devolve a iguaria no dispenser. Olha, olha e pega uma caixinha. Volta mais uma vez em direção ao pai.


“Papai! Papai!”


“Oi, querida”


“É Kinderovo. Gosto tanto de Kinderovo.”


“É mesmo? Não sabia que você gostava tanto assim.”


“Eu gosto!”


Daí transborda todo o seu charme e continua com uma voz pra lá de sapeca:


“E tem surpresinha dentro, papai”


O pai já nem responde.


“Mas só no final de semana, né?”


“Isso. Só no final de seman... Peraí: você vai guardar tudo o que vai querer no final de semana?”


“Vou papai. Não gasto minha cabeça com bobeiras, não.”



O pai não responde, apenas sorri pela metade.

Chegou sua vez de passar as compras no caixa.


Eu sou a próxima. Não vejo a hora de chegar em casa e descansar um pouco.