terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Assobio

Era um dia de primavera no Hemisfério Norte. O céu estava claro e o clima ameno naquela cidadezinha às margens do Tejo. A família toda reunida em Alferrarede para o batizado. Ela tinha quatro anos; era praticamente uma moça já. A demora em torná-la uma cristã oficial se deu porque naquela época não se pagavam viagens aéreas em 10 vezes no cartão de crédito e nem a concorrência entre as empresas era tão grande no mundo, o que hoje baixa os preços e gera promoções relâmpago. Avião ainda era coisa para poucos.

Assim, até se juntar uns trocados para levar toda a família para Portugal demorou um pouco. Mas seus pais faziam questão que os padrinhos da menina fossem velhos amigos da África: Otília e Júlio. E assim foi. Otília falava pelos cotovelos, e não era por conta do batismo, não. Era natural. Era dela. E no português de Portugal tornava quase indecifráveis suas palavras às meninas do Brasil ainda pequenas. Júlio, uma simpatia. Cara de bom moço. Jeito de bom moço. Bom moço.

Enfim, as meninas estavam de vestidos claros, com chapéu de tecido à lá anos 20. Não me lembro bem da igreja em si, mas é muito forte em minha memória a imagem dos jardins pelos quais passeei antes e depois da celebração. Não sei se eram jardins da própria igreja, de uma praça perto. Alguma coisa assim. Recordo que havia até uma pequena ponte japonesa, daquelas pintadas por Monet.

A família toda reunida, seria mais um batizado. Mais uma cerimônia religiosa comum. Não fosse pelo fato de o padre ser cortado algumas vezes em sua celebração da missa porque a ainda pagãzinha o interrompia. E com assobios. A menina não parava de assobiar. Ela tinha aprendido fazia pouco a artimanha e foi assim que resolveu entrar na igreja: assobiando.

Ah, o nome da menina é Kátia.